There Must be a Place @ Centro Cultural da Gafanha da Nazaré: os bons amigos


Foi em dias de verão que duas talentosas bandas, conversaram a vontade de levar o calor e algo único, mais perto do público português. There Must be a Place juntou amigos de longa data e colegas de carreira musical, vindos do grande Porto – Best Youth, o dinamic duo de Ed Gonçalves e Catarina Salinas; We Trust, o projeto do mestre André Tentúgal.

Duas bandas de sonoridades e ideais que faziam falta ao panorama nacional, reconstruíram temas de "Winterlies", EP de estreia dos Best Youth e "These New Countries", primeiro álbum We Trust, dando-lhes vida em acústico e novas personalidades.

As noites invernosas estão quase a acabar e para os adeptos dos dias frios, uma má noticia nunca vem só. A tournée que levou There Must be a Place às principais salas de espetáculo, chegou á pequena e chuvosa cidade da Gafanha da Nazaré, na penúltima data desta partilha em palco. Numa curta aula de geografia, situamos There Must be a Place, no distrito de Aveiro, concelho de Ílhavo, a 75km da sua cidade natal.

A sala de teto vermelho e cadeiras beges, cobriu-se de tons friorentos, prontos para se deixarem aquecer com as (merecidas) palmas e momentos de dança, que estavam para vir. Sem mais demoras, a bateria de Nuno Sarafa entra numa introdução que puxou a banda, um a um, até ao palco. André Tentúgal faz as honras da casa com "Waiting", o nono tema do alinhamento do seu trabalho em estúdio. Catarina Salinas, a Kate dos BY, entra em cena, com todo o seu carisma e voz nasalada, à qual se junta um instrumental intimista.

"Wait for me", de "Winterlies", soa a amor e ao que ele obriga. Se Iggy Pop e Mick Jagger estivessem na plateia, sentir-se-iam inspirados para toda a vida, tudo porque a postura dançante de Catarina tem tanto de charme, como o seu batom vermelho. Segue-se "Too kind to mind", o tema que me fez soltar emocionadas palmas descoordenadas, em confronto com uma plateia bem mais competente. Há vozes que abraçam, que confortam e neste tema, Tentúgal cumpre a tarefa, sem qualquer esforço.

"Again" põe gafanhões – o nome dado a quem vive nas 7 Gafanhas existentes – e companhia, numa cantoria tímida "sometimes i can feel it all, sometimes i can feel it" sobre o comando do André-maestro. Agora é tempo para afinar as guitarras e passar ao marketing da banda, numa brincadeira que junta a venda do álbum no final do concerto, e todos os entusiastas presentes, à possibilidade de receberem um chocolate e um beijinho. Ouve-se "Freedom Bound", onde um solo saído de uma les paul branca, tocada por Ed, nos faz viajar por uma road trip sem fim.

"Nice face" traz de novo ao palco, a aura Best Youth, com Ed e Catarina como personagens principais de uma narrativa de afeto musical, com as interjeições do costume – os ‘uuh’ que arrepiam os cabelos dos recém apaixonados. "Shouts" guardava em si, dinâmicas que revisitavam o sucesso da inconfundível Róisín Murphy, ainda com os Moloko, em "The Time is Now". Em “Once at a time”, Tentúgal comanda as tropas por uma multidão disfarçada, a entoar o verso homónimo. O single de apresentação desta aventura, "Tell me something" arranca os primeiros gritos (de entusiasmo) da plateia e numa partilha de microfone, é roubado um beijinho ao rosto de Catarina. Ainda dentro do tom, reconhece-se a letra da canção que Stevie Nicks eternizou, "Dreams" dos Fleetwood Mac, e os sorrisos, vêm-se à distância.

“Este é o momento para ligarem a alguém especial ou darem a mão à vossa pessoa…mas vejam lá a quem dão a mão” antecedeu o love is in the air característico de “Them Lies” –  que é como quem diz, o “momento Miminho” (segundo Catarina).

A mística eletrónica  chega perto do público com "Hang Out", um dos mais aclamados temas made in Best Youth, com um baixo (de Fernando Sousa) de notas fortes, uma guitarra que canta e um trabalho de teclas, a cargo de Sofia Ribeiro, que nos soa a esperança. Sem intervalos, canta-se a pares, Ed+Kate e André+Sofia = "Playground Love", o original dos Air; mesmo sem Sofia Coppola a assistir, o cenário naquela sala, era perfeito.

Antes de "Honey Trap" – que continuará no aiplay radiofónico caseiro como um dos clássicos dos Best Youth – apela-se à plateia, que aproveitem o momento, com as máquinas fotográficas em repouso. Tocou-se uma versão mais acelerada, com um "outro" explosivo que todos naquela sala irão guardar para ti, sobre a condição ditada "Don’t tell anyone".

"Esperemos encontrar-vos outra vez…sejam felizes", dizia Tentúgal em jeito de despedida, antes de tocar o exemplar "Time (better not stop)", que precocemente fez parte da banda sonora do verão  de 2012, em Portugal e além fronteiras. O público dançava sentado nas cadeiras mas alguns mais corajosos responderam ao impulso e levantaram-se. A emoção saltava entre o palco e os pezinhos de dança. O vocalista agarrou o momento e pediu para que todos fingissem fazer parte de um coro de Gospel, no acompanhamento de "Surrender". A música favorita de André, do álbum There Must be a Place, é também a mais doce – sabe a caramelos e rebuçados – que adoçou a noite chuvosa de sábado, na mais famosa das Gafanhas. O "até já" é feito em jeito de serenata e a a sala pediu por mais, ao entoar os ensinamentos de Tentúgal. No regresso ao palco, ainda se cantava o refrão de Surrender.

"When all the lights are down", faz aparecer uma melódica que nos conta uma história de embalar. "Esta é mesmo a última!" – afirmação agridoce do frontman We Trust à qual Catarina acrescentou "Se quiserem sair dos lugares e vir curtir connosco, ainda mais…", que levantou o público de uma vez por todas e a festa passou para cima das tábuas, ao lado do ensemble de músicos. Gritava-se de pulmões cheios "Façam mais um CD" e as palmas faziam a comemoração de uma noite que a Gafanha da Nazaré não (via e) ouvia há demasiado tempo.

Próxima paragem: 30 de março na Figueira da Foz; marca a última data dos músicos como There Must be a Place. Até mais novidades, que este lugar musical não fique "lost in translation".

Fotos: Ana Martelo
Texto: Sara Mónica