Vodafone Mexefest Lisboa '12: 2º dia, 8 dezembro


Neste segundo dia, nova maratona de concertos e maior dificuldade de escolha para festivaleiros e jornalistas. Foram variadas as vezes que vimos os nossos colegas escribas e, principalmente fotógrafos a chegarem ou saírem esbaforidos aos espaços para tentar apanhar um pouco de todos os concertos do festival. Também o público tentava planear o melhor possível para conseguir aproveitar ao máximo o festival e fazer render o preço do bilhete (vimos muitas tabelas riscadas, com percursos já traçados). A entrada no Tivoli, por exemplo, era de mais dificíl entrada do que na noite anterior, uma vez que tinha os dois pesos pesados do dia: Michael Kiwanuka e Django Django (na foto).

Optámos por tentar conhecer os espaços que nos faltavam do festival e que estavam carregadinhos de bons concertos. Primeiro demos uma espreitadela aos animados Roda de Choro de Lisboa, uma presença já habitual na noite lisboeta e que convidam a um pézinho de dança, a pares, com o seu chorinho característico do Rio de Janeiro.

Atravessámos a rua para ficar na fila do elevador e subir até ao terraço do Hotel Altis Avenida e desvendar o projeto Vitorino Voador, aventura a solo do músico português João Gil (You Can’t Win Charlie Brown, Diabo na Cruz, Feromona, etc).  Com um EP lançado recentemente pela Optimus Música e o primeiro álbum a sair no próximo ano, Vitorino Voador está recheado de músicas que são histórias pessoais do seu intérprete e que, num registo de "cantautor", misturado com um apurado senso de humor e boa disposição nos intervalos, consegue animar este início de noite e levar a que muita gente ocorresse ao hotel para apreciar mais do que a bela vista da avenida. Ainda ouvimos, por exemplo, "Balada dos FDPs" que o autor, acompanhado do produtor do álbum (o músico José Castro) gentilmente dedicou aos assaltantes do seu carro.

Já na rua das Portas de Santo Antão, descobrimos mais um belo espaço deste festival, a Igreja de São Luis dos Franceses, onde Aldina Duarte estava acompanhada pelo piano de Júlio Resende (que já tinha acompanhado Elisa Rodrigues na noite anterior). Mais uma vez o público respeita um silêncio "religioso" em cada fado, que a cantora interpretava com uma alma gigantesca, só interrompido pelas ovações no final.  A igreja pequena, mas lindíssima, era palco para o cumprir de um sonho da cantora que revelou que sempre quis cantar num espaço como aquele.

Era obrigatório passar de novo pela Sociedade de Geografia de Lisboa para ver Peixe (guitarrista dos Ornatos Violeta) a solo. Movendo-se em territórios da folk, do blues e do experimentalismo, o músico revelou estar a preparar novo álbum depois de "Apneia" lançado este ano. Contou como convidados Pedro Gonçalves (Dead Combo) e o seu contrabaixo em várias músicas, e ainda, um dos maiores guitarristas portugueses da atualidade: Norberto Lobo. Juntos interpretaram uma música mais experimental antes do final do concerto se fazer em tons mais "havaianos".

Antes de subirmos a avenida, ainda confirmámos o bom momento de Nick Nicotine e a sua Nicotine’s Orchestra na Casa do Alentejo. Do Barreiro chegam baterias explosivas e guitarras em tom de western, que rodam entre o garage rock e o blues em canções como "Crazy" ou "Hit Me Like the First Time" do recente "Gipsycalia". Não havia tempo para muito mais, pois aproximava-se a hora dos concertos mais aguardados da noite…

Ainda antes de furar as filas gigantescas do Tivoli, tivemos um cheirinho de classe com os Soaked Lamb na sala Montepio do São Jorge. Numa sala pequena mas cheia, a banda apresentava-nos um clássico de Hank Williams com arranjos de Rodrigo Leão, em tons de cabaret dos anos 20. Merecia maior atenção, mas precisávamos de atravessar a rua para confirmar a qualidade dos cabeças de cartaz. Aos Soaked Lamb deixamos um "até já", numa outra ocasião.

Furada a fila, comprovámos a justiça das críticas elogiosas ao músico britânico. Michael Kiwanuka encanta qualquer plateia com a sua simpatia e com a sua música. Andando entre a pop e a soul, arriscando por vezes algo mais rock, o cantor de 24 anos apresentou neste seu último concerto da tournée, antes do Natal, uma inspirada versão de "May This Be Love" de Jimi Hendrix, baladas como "Worry Walks Beside Me" ou o hit "Home Again" (faixa-título do seu álbum). O público foi totalmente conquistado (mesmo o que marcava lugar para a banda seguinte) e mostrou-o com os coros (até na nova "Rest") e a ovação no final.

Quase no tempo que levou a fazer o change over entre concertos, fomos à sala principal do São Jorge confirmar que Noiserv já começa a ter o público que merece (os 800 lugares estavam quase cheios) para a sua caixinha de surpresas que comove cada vez mais pessoas. Neste caso, o músico (entre álbuns) não apresentou músicas novas e apenas colocou a ilustradora que faz desenho ao vivo nos seus espetáculos, no lugar onde merece: no palco, pois é parte essencial para a criação da atmosfera em músicas como "Melody Pops" ou "Consolation Prize".

Quisemos perceber que diferenças trazia James Iha desde os seus já longínquos tempos de Smashing Pumpkins e descemos até uma Casa do Alentejo quase vazia, em que alguns saudosistas (todas já na casa dos 30/40 anos) confirmaram que o músico inveredou por caminhos bastante diferentes. De cabelo quase branco puxado para trás, James estava bastante comunicativo e tentou com isso cativar o público, já que as músicas pop lo-fi não faziam grande coisa por isso. Os seus tempos de rock já passaram e o público está bem acima na avenida, a fazer fila para a novidade mais recente.

Chegava a altura de comprovar o outro fenómeno mais recente presente no festival. Os Django Django já conquistaram uma numerosa legião de fãs em Portugal, apesar de só terem um álbum no currículo. E a banda escocesa transformou o Tivoli numa verdadeira rave hipster com os seus sons de electrónica tropical conjugadas com o poder de guitarras rock. Todos vestidos de igual e, provavelmente, espantados por tanto sucesso e por tanta gente estar ali para vê-los, na primeira vez que visitam o nosso país, os Django capricharam no concerto. Não houve música em que o público não abanasse as ancas ou pulasse até não conseguir mais. Era concerteza, a maior festa do festival. Com canções de pulsar forte como "Love's Dart" ou "Skies Over Cairo" ao ritmo de percussões múltiplas, que transportaram a sala até às "mil e uma noites nas arábias" os detentores de um dos melhores álbuns do ano, consiguiram levar o público ao histerismo. Quase nem eram necessários os riffs característicos de "Default" ou as sirenes de "Wor" para terminar o concerto em loucura. Terminar não, pois ainda voltaram para um encore (raro neste festival) com "Silver Rays". Foi concerteza a maior festa deste festival.

Também uma festa (de menor dimensão) tentavam os Light Asýlum fazer no Ateneu embora sem grande resposta por parte do público. E bem tentou a dupla norte-americana (o multi-instrumentista esquálido Bruno Coviello e a vocalista eléctrica Shannon Funchess, de voz possante e uma t-shirt que substituía os Nirvana por Rihanna) animar as hostes com "Skull Fuct" (retirada do EP "In Tension") ou "Dark Allies" e "IPC" do álbum homónimo, mas não teve sucesso. Quem sabe, no futuro não poderão passar num Lux e agradar a outros públicos.

Passando pelo Ritz encontrámos mais uma sala "à pinha" para ver uma reforçada banda em ritmo funk, os Escort que faziam suar os presentes. Com uma vocalista de farta cabeleira e vestido de lantejoulas com a bandeira britânica, a fazer lembrar outras cantoras negras que por cá passaram à bem pouco tempo (lembram-se de Janelle Monaé?) ninguém conseguia ficar parado.

Não houve tempo para muito, pois os Efterklang já tocavam na sala principal do São Jorge. E não era só o Tivoli que enchia, pois também aqui não cabia mais ninguém. Depois de uma visita ao Musicbox em 2010, os dinamarqueses ganharam público e apresentaram aqui o novo "Piramida" para uma plateia cheia. A pop electrónica da banda, acompanhada de projeções para cada música, não deixou ninguém colado às cadeiras. E já que falámos de estilo em cima, não haveria ninguém mais impecavelmente vestido que os membros desta banda. Bastante comunicativos (talvez agradados com o facto de dobrarem o seu público desde a última visita) mostraram que do Norte da Europa não vem só o frio, pois canções como "Monumento", "Sedna", "Between the Walls" e "Modern Drift" aqueceram a noite fria de Outuno.

Para terminar, passámos pela Estação Vodafone FM para ver os MS MR, duo nova-iorquino composto por Lizzy Plapinger (a voz) e Max Hershenow (com as programações e sintetizadores). No cenário mais carismático deste festival e perante um público bastante numeroso mostraram o porquê do seu EP de estreia "Candy Bar Creep Show" lhes ter granjeado banstantes elogios na Pitchfork, por exemplo. Com uma música influenciada claramente pela New Wave dos anos 80 e com uma vocalista que concentra atenções, não só pela aparência física, mas também pela voz potente, conquistaram o público e significaram para nós um fecho bastante digno deste festival.

Faltou-nos espreitar o Ministerium, mas segundo o que ouvimos a perda não foi de grande monta.

Como balanço final, poderemos dizer que o Vodafone Mexefest cresceu em todos os sentidos, continuou a pôr o público a saltitar de descoberta em descoberta dos novos sons que aparecem todos os anos e apostou ainda na nova música portuguesa (em todos os quadrantes musicais, do jazz à electrónica), coisa que outros não fazem (e elogios sejam feitos, neste aspecto, à Musica no Coração e seus programadores).

Como nota negativa (?), a quantidade de salas superlotadas que não permitiram a muita gente ver o que gostaria. O que, se por um lado, é positivo, pois permite que outros concertos tenham o público que merecem, mas que nunca teriam, por outro as críticas vão-se avolumando de ano para ano e será tempo de pensar em ter uma sala maior para certos nomes. Referências finais para o número oficial de espectadores (10400, segundo a organização) e para o cancelamento do Vodafone Mexefest Porto devido a outras prioridades do patrocinador na área da música (Paredes de Coura?).

Fotos: Pedro Figueiredo e Vic Schwantz
Texto: Miguel Lopes